Os conflitos gerados pelas diferenças de objetivos de vida entre as gerações nunca foram tão marcantes como nos dias atuais. Jovens avós, filhos e netos parecem de um lado nascidos na mesma década: possuem interesses culturais e sociais similares, assim como seu gosto por moda, passeios, música, viagem, esportes é bastante próximo. De outro lado, por seus objetivos essenciais de vida, são muito distintos, parecem por vezes nascidos em séculos diferentes!
A geração dos anos quarenta e cinquenta, hoje tornada avó, foi de crianças educadas dentro de princípios chamados tradicionais, nos quais a figura paterna era extremamente respeitada, os papéis eram bem definidos, a autoridade tendia ao autoritarismo, a obediência não era discutida, posta em dúvida e, provavelmente, sua educação pouco se distinguia daquela recebida por seus pais. Tratava-se, antes de imitar, de seguir modelos, sem desejo ou necessidade de arriscar mudanças.
A linguagem, as roupas, os gostos entre as pessoas da mesma geração eram similares, mas até por qualquer desses itens se podia saber quem era o pai e o filho, claramente. Houve o começo do uso da informática para fins comerciais, embora ainda não de forma massificada, e teve início a grande revolução comportamental, como o surgimento do feminismo e os movimentos civis em favor dos negros e homossexuais. Esses acontecimentos mudaram gradativamente o pensamento, o comportamento das pessoas, a maneira de pensar e agir.
A geração dos anos setenta cresceu em uma fase de transformações marcantes, com muitas mudanças na família, na sociedade, no mundo: a ciência começou a sair em ritmo acelerado dos centros de pesquisas, das universidades para o mundo, para o cotidiano, alterando, definitivamente, os meios de comunicação e as relações entre as pessoas e as gerações. Evidentemente, os modelos educacionais vivenciados já não eram os mesmos, porque as necessidades do momento já não eram as mesmas. O tempo passou, a sociedade que tinha o objetivo de criar um cidadão “obediente” também foi vencida pelo anseio de educar pessoas responsáveis, autônomas em circunstâncias novas, sem padrões anteriores a seguir.
A liberdade de pensamento passou a ser uma exigência dos jovens, que começaram a se tornar senhores de sua vida, quebrando normas tradicionalmente aceitas. Experimentaram, na juventude, muitos caminhos, e amadureceram de modo diferente de seus familiares.
Ao se tornarem eles pais, não tendo um modelo educativo estabelecido e vivendo um momento extremamente dinâmico da sociedade, naturalmente, transformaram-se nos primeiros pais que têm – justificadamente – maior dificuldade em estabelecer limites entre eles e seus filhos: muitas vezes confundem os papéis, delegam responsabilidades, acabam por parecer irmãos e irmãs dos filhos, que acabam por se tornar órfãos de pais vivos. Com a desculpa ilusória de serem amigos dos filhos, deixam-nos sem pais...
Acontece que crianças são, por natureza, admiradoras de seus pais e verdadeiros “discípulos” naturais destes, e despertar uma amorosa admiração dos filhos se torna uma responsabilidade muito pesada para quem não está preparado para isso. E admiração se cria na observação, no dia a dia, de comportamentos coerentes e serenos, que transmitem segurança, geram ordem e disciplina, elementos, estes, sem os quais, obviamente, não se estruturam relações equilibradas, personalidades estruturadas, pessoas responsáveis ou autocontroladas.
Nunca se ouviu falar tanto como na atualidade em problemas disciplinares e a razão, provavelmente, está – na maioria dos casos –, justamente, na questão do autocontrole e da responsabilidade, que deixam de ser ensinados e cobrados das crianças, seja por excesso de zelo, de superproteção familiar ou por negligência, três terríveis violências contra a saúde mental infantil.
A disciplina verdadeira e duradoura é criada por uma identificação contínua e profunda com adultos, e é responsável pelo estabelecimento do autocontrole. Quando tal processo é supérfluo, as crianças desenvolvem um autocontrole frágil e, assim, sempre precisarão de alguém que as vigie, já que não sentirão a necessidade e nem a possibilidade de se controlar e agir certo em qualquer situação onde não sejam cuidadas.
O castigo entra nesse ponto, onde se exige a obediência e não o autocontrole: a punição acaba por tornar a criança menos cooperativa, o adulto perde a paciência, o autorrespeito e o respeito pela criança, e parte para a agressão física ou verbal, no desejo de reprimir o comportamento infantil.
O castigo, físico ou verbal, não leva em conta a necessidade real de se dar a oportunidade à criança de agir bem, repensar seus atos, palavras e comportamentos, de se sentir amada e respeitada ao longo de seu crescimento, e pior: não ensina autocontrole, não desenvolve o desejo de copiar comportamentos admirados por elas mesmas.
Compreendermos a relação entre as gerações. Nosso papel e responsabilidade social e familiar na criação de nossos filhos certamente farão, de todos nós, pais melhores, capazes de oferecer oportunidades reais de educar crianças e adultos equilibrados, autocontrolados, responsáveis e mais felizes em um mundo cada vez mais dinâmico.